Doze anos de "nostalgia, ULTRA"; relembre a história da mixtape de estreia do Frank Ocean

Em 2009, Christopher “Lonny” Breaux era um jovem compositor que estava tentando escapar de Nova Orleans após o devastador furacão Katrina. Ao pisar em Los Angeles em busca de um diploma na faculdade e melhores oportunidades na indústria de entretenimento, o artista conheceu os produtores Bruce Waynene e Dirty Swift que, juntos, formam a dupla Midi Mafia, responsável por criar hits como "21 Questions", do 50 Cent. Com conexões assim, Christopher rapidamente começou a trabalhar como compositor para nomes como Brandy, John Legend e até mesmo Justin Bieber. 

Lonny Breaux assinou com a gravadora Def Jam Recordings, abandonou a venda de suas demos, se juntou com o coletivo Odd Future e passou a investir em composições próprias, inaugurando seu novo nome artístico, Frank Ocean. Em fevereiro de 2011, "nostalgia, ULTRA", a mixtape de estreia do cantor foi liberada no Tumblr de forma gratuita e sem nenhum tipo de divulgação. O projeto ganhou destaque pela versatilidade e experimentação que Frank Ocean demonstrou ao usar samples e fazer remixes de músicas do Radiohead e Mr. Hudson. Elementos de R&B, rap e rock alternativo se misturam com letras explícitas sobre nostalgias excruciantes, homofobia, casamento LGBTQIA+, pensamentos suicidas, drogas, inocência perdida e relações interpessoais. 

Apesar de ter assinado com uma das maiores gravadoras de todos os tempos, a Def Jam continuava varrendo músicas para debaixo do tapete e negando apoio financeiro para as visões ambiciosas do artista. Em resposta a falta de interesse do selo em que participava, Frank Ocean lançou o "nostalgia, ULTRA" por conta própria e arcou com as despesas sozinho. Mesmo sem o devido suporte, a mixtape conseguiu chegar nos fones de ouvido da Beyoncé, Jay-Z e Kanye West poucos meses depois do lançamento, gerando colaborações em faixas como "I Miss You" e "Church In The Wild". Além das participações bem sucedidas com artistas veteranos, a recepção da crítica especializada e dos fãs foi extremamente positiva. A movimentação ao redor da mixtape fez a gravadora querer relançar o projeto como um EP para gerar ainda mais tração. A tracklist foi divulgada, mas o EP oficial de "nostalgia, ULTRA" nunca viu a luz do dia, pois o cantor preferiu direcionar o foco para seu primeiro álbum de estúdio que, em 2012, se tornou o magnífico "Channel Orange". 

O projeto contém catorze faixas, incluindo um cover melódico de "Strawberry Swing", do Coldplay, um remix do clássico "Hotel California", da banda The Eagles, e "Nature Feel", uma belíssima repaginação da letra e dos vocais de "Electric Feel", do MGMT. Entretanto, os maiores destaques da mixtape são as músicas originais, como a viagem psicodélica no Coachella em “Novacane”, a irônica "Songs For Women" e as referências visuais do Stanley Kubrick em "Lovecrimes".

Foto: Terry Richardson

A obra foi construída em cima da vívida paisagem de anseio pelo passado, montada através de diversos interludes que misturam sons de fitas cassetes rebobinando, vozes femininas perguntando "o que é um Radiohead", barulhos de televisão e samples de jogos clássicos de videogame, como Street Fighter, Metal Gear Solid, Goldeneye 007 e Soulcalibur. Além disso, a mixtape também marcou o início da longa obsessão do artista com carros antigos e cores vibrantes. A respeito do significado e importância da capa do projeto, que contém a foto de uma BMW E30 M3 laranja de 1980, Frank Ocean revelou à revista Complex que esse era o carro dos seus sonhos e que representava quem ele era como pessoa. 

A sensibilidade e intuição do artista é presente ao longo de todas as músicas e fez a mixtape ser considerada o avant-garde do R&B contemporâneo, quebrando os moldes antigos do que o gênero significava e concebendo um toque mais moderno, subversivo e genuíno. Antes mesmo de desenvolver outras obras ainda mais ilustres e profundas, como "Blonde", Frank Ocean já desmantelava preceitos da indústria musical e, mesmo de forma inconsciente, acabou se tornando a voz da sua geração.