Sidoka da levada venenosa, vó dela de Gucci, pai dela de Adidas. O Belo Horizontino que em um pequeno show de bar da cidade, em uma apresentação de uma música só - 'Nativo', sua carta de mestre até então - impressionou ninguém menos que o representante nacional de um cenário apagado da panelinha SP - RJ em que sobrevivia a cena mineira de Hip Hop. Com certeza mais que impressionado, demorou menos de 24 hora pra que Sidoka recebesse uma ligação de Djonga, recrutando-o para a que seria uma das faixas mais imponentes do álbum 'O Menino Que Queria Ser Deus'.
Uma história que todos conhecemos pela 'UFA', de um mérito que já estava sendo construído com os periódicos lançamentos do EP Dokaz, objeto em questão de hoje. Em janeiro deste ano, Sid lançava 'Duz Cara', com produção do De Sá, Trap que eu na cara de pau enchia o saco para saber se seria tocada a cada performance - quase semanalmente - que ele fazia na falecida Growers, espaço de cultura no bairro Anchieta em Beagá. Sinceramente, não é tão fácil assim criticar o trampo de um amigo, mas o farei com o alvará do Sidoka (não que eu tenha muita coisa a criticar).
'Duz Cara' sempre sintetizou pra mim, no que antes era um repertório ainda curto do artista, qual era o seu diferencial entre aqueles tantos trappers de SoundCloud que pipocavam dos mais variados cantos do Brasil. Em quatro minutos de agressividade, ele fazia o público inteiro do show sair em estasia, suados de trap, espantados com a energia que faziam seus corpos mosharem sem descanso, contrariando as vontades racionais e capacidades físicas. Recorrentemente o assunto do pós era: 'Mano, se eu fiquei desse jeito depois de uma música só, vai sair morte de um show inteiro do Sidoka, o corpo num aguenta'.
E isso sempre me levava a confrontar algumas pessoas que comentavam das músicas dele sem nunca terem dado a chance de entender o ambiente que elas criam. 'Ah, ele só grita, a voz dele é engraçada, não fala nada com nada nas letras'. Então, estou aqui para contra argumentar essa bobagem.
Quem já foi em um show do Djonga - o que não me surpreende ter feito os dois artistas se conectarem dessa forma - sabe que um show de Punk fica leve diante de tudo o que acontece ali. Esses dois gêneros musicais, movimentos culturais, tem lá sua semelhança e proximidade de luta e importância social. A diferença, passando pela estrutura de ressignificação e mutabilidade do Hip Hop de 'apropriação' de diversas sonoridades e abordagens, fez com que chegássemos ao ponto de termos o Sidoka, um trapper mais Punk do que o próprio cenário atual desse gênero - e com certeza muito mais do que seu tio grisalho que quinta à noite frequenta a Obra e veste seu colete de couro guardado no fundo do armário - impondo toda a anarquia da energia e DIY - 'do it yourself', até porque ele fazia quase tudo por conta própria no Dokaz, inclusive engenharia de som - e ainda conquistando o público com a mescla do Trap com autotune e rimas debochadas.
Clique por Dos Anjos @dosanjosfotos
Focar apenas na performance ao vivo realmente não faz tanto sentido na análise do EP em si, mas parte para um ponto crucial. Nas primeiras gravações, só se entenderia essa característica do Sidoka comparecendo à uma dessas apresentações. Contudo, creio que ciente disso, ele trabalhou para que esse ponto forte também se sobressaísse na experiência do ouvinte pelo meio digital. Incluindo mais presença de voz, consegue com que Dokaz seja uma aproximação fiel de sua presença de palco.
O EP foi lançado em partes, com um intervalo de aproximadamente duas semanas entre cada track. Tal estratégia vem sendo muito utilizada ultimamente pelos novos artistas, principalmente quando a coesão entre as faixas não importa muito, dando mais tempo para o hype específico de cada uma. Encaixa no pretexto das playlists, embora infelizmente o projeto não se encontre nas plataformas de streaming devido à algumas beats roubadas.
Este, um dos pontos mais fracos na minha opinião. Tais produções achadas na internet não agregam em nada no potencial do artista, apenas dão seus espaços entre hi-hats para que ele descarregue sua levada. Porém, o trabalho ainda contém boas beats autorais do De Sá em 'Duz Cara' e 'Madrugada pt 2'.
Ainda que se priorize a estética e abordagem, é uma injustiça falar que o Sidoka rima nada com nada. Existem momentos de pertinência muito bem sacados em alguns momentos do projeto, sem estragar a intenção de descontração e entretenimento propostos numa música de Trap. Um bom exemplo disso é perceptível em 'Lowiez' e 'Visitei Meus Demônios', esta última disponível só no SoundCloud.
Outro mérito na entrega do artista é uma inovação trazida pelo Igu, da Recayd Mob. Os dois rappers conseguem flexionar algumas palavras do português da mesma forma que os gringos fazem normalmente com a língua inglesa, distorcendo a fonética de pronunciações normalizadas. O membro do coletivo MVPTRAPSQUAD, muito influenciado pelo Young Thug na estrutura de verso - tamanho e triplets - e pelo Travis Scott na tonalização dos autotunes - Sloppy Toppy que o diga - consegue traduzir o Mumble Rap à agressividade e referencial local, brasileiro, à lá Djonga no Boom Bap.
Sem falar que, 'Mi'aDama' e Europa Pt. II servem tanto para os apaixonados quanto para os porradeiros, o artista transmite sua versatilidade no alcance de públicos diversos. Mia'Dama, seu maior hit, está a cinquenta mil visualizações do primeiro milhão. O sonho de vários artistas sendo realizado por um dos únicos que praticamente não causa inveja em ninguém. Pessoalmente, pelo menos, nunca presenciei alguém que não sinta orgulho de ver o menino subir. Sem dúvida, um presente para todos aqueles que acompanharam o primeiro mil do SoundCloud, nada mais justo que alcançar essa marca antes do seu álbum por vir, Intactoz, que também dá nome à uma das tracks do Dokaz.
Uma história que todos conhecemos pela 'UFA', de um mérito que já estava sendo construído com os periódicos lançamentos do EP Dokaz, objeto em questão de hoje. Em janeiro deste ano, Sid lançava 'Duz Cara', com produção do De Sá, Trap que eu na cara de pau enchia o saco para saber se seria tocada a cada performance - quase semanalmente - que ele fazia na falecida Growers, espaço de cultura no bairro Anchieta em Beagá. Sinceramente, não é tão fácil assim criticar o trampo de um amigo, mas o farei com o alvará do Sidoka (não que eu tenha muita coisa a criticar).
'Duz Cara' sempre sintetizou pra mim, no que antes era um repertório ainda curto do artista, qual era o seu diferencial entre aqueles tantos trappers de SoundCloud que pipocavam dos mais variados cantos do Brasil. Em quatro minutos de agressividade, ele fazia o público inteiro do show sair em estasia, suados de trap, espantados com a energia que faziam seus corpos mosharem sem descanso, contrariando as vontades racionais e capacidades físicas. Recorrentemente o assunto do pós era: 'Mano, se eu fiquei desse jeito depois de uma música só, vai sair morte de um show inteiro do Sidoka, o corpo num aguenta'.
E isso sempre me levava a confrontar algumas pessoas que comentavam das músicas dele sem nunca terem dado a chance de entender o ambiente que elas criam. 'Ah, ele só grita, a voz dele é engraçada, não fala nada com nada nas letras'. Então, estou aqui para contra argumentar essa bobagem.
Quem já foi em um show do Djonga - o que não me surpreende ter feito os dois artistas se conectarem dessa forma - sabe que um show de Punk fica leve diante de tudo o que acontece ali. Esses dois gêneros musicais, movimentos culturais, tem lá sua semelhança e proximidade de luta e importância social. A diferença, passando pela estrutura de ressignificação e mutabilidade do Hip Hop de 'apropriação' de diversas sonoridades e abordagens, fez com que chegássemos ao ponto de termos o Sidoka, um trapper mais Punk do que o próprio cenário atual desse gênero - e com certeza muito mais do que seu tio grisalho que quinta à noite frequenta a Obra e veste seu colete de couro guardado no fundo do armário - impondo toda a anarquia da energia e DIY - 'do it yourself', até porque ele fazia quase tudo por conta própria no Dokaz, inclusive engenharia de som - e ainda conquistando o público com a mescla do Trap com autotune e rimas debochadas.
Clique por Dos Anjos @dosanjosfotos
Focar apenas na performance ao vivo realmente não faz tanto sentido na análise do EP em si, mas parte para um ponto crucial. Nas primeiras gravações, só se entenderia essa característica do Sidoka comparecendo à uma dessas apresentações. Contudo, creio que ciente disso, ele trabalhou para que esse ponto forte também se sobressaísse na experiência do ouvinte pelo meio digital. Incluindo mais presença de voz, consegue com que Dokaz seja uma aproximação fiel de sua presença de palco.
O EP foi lançado em partes, com um intervalo de aproximadamente duas semanas entre cada track. Tal estratégia vem sendo muito utilizada ultimamente pelos novos artistas, principalmente quando a coesão entre as faixas não importa muito, dando mais tempo para o hype específico de cada uma. Encaixa no pretexto das playlists, embora infelizmente o projeto não se encontre nas plataformas de streaming devido à algumas beats roubadas.
Este, um dos pontos mais fracos na minha opinião. Tais produções achadas na internet não agregam em nada no potencial do artista, apenas dão seus espaços entre hi-hats para que ele descarregue sua levada. Porém, o trabalho ainda contém boas beats autorais do De Sá em 'Duz Cara' e 'Madrugada pt 2'.
Ainda que se priorize a estética e abordagem, é uma injustiça falar que o Sidoka rima nada com nada. Existem momentos de pertinência muito bem sacados em alguns momentos do projeto, sem estragar a intenção de descontração e entretenimento propostos numa música de Trap. Um bom exemplo disso é perceptível em 'Lowiez' e 'Visitei Meus Demônios', esta última disponível só no SoundCloud.
Outro mérito na entrega do artista é uma inovação trazida pelo Igu, da Recayd Mob. Os dois rappers conseguem flexionar algumas palavras do português da mesma forma que os gringos fazem normalmente com a língua inglesa, distorcendo a fonética de pronunciações normalizadas. O membro do coletivo MVPTRAPSQUAD, muito influenciado pelo Young Thug na estrutura de verso - tamanho e triplets - e pelo Travis Scott na tonalização dos autotunes - Sloppy Toppy que o diga - consegue traduzir o Mumble Rap à agressividade e referencial local, brasileiro, à lá Djonga no Boom Bap.
Sem falar que, 'Mi'aDama' e Europa Pt. II servem tanto para os apaixonados quanto para os porradeiros, o artista transmite sua versatilidade no alcance de públicos diversos. Mia'Dama, seu maior hit, está a cinquenta mil visualizações do primeiro milhão. O sonho de vários artistas sendo realizado por um dos únicos que praticamente não causa inveja em ninguém. Pessoalmente, pelo menos, nunca presenciei alguém que não sinta orgulho de ver o menino subir. Sem dúvida, um presente para todos aqueles que acompanharam o primeiro mil do SoundCloud, nada mais justo que alcançar essa marca antes do seu álbum por vir, Intactoz, que também dá nome à uma das tracks do Dokaz.
Brindando aos alto falantes que tocarão o esperado novo álbum, deixo minha análise com um 8/10 que só tende a crescer nos próximos trampos. Um dos artistas mais importantes do cenário de Trap atual, assim como o Yung Buda da última review - e parece que vai sair uma collab dos dois para a alegria dos fãs - a levada venenosa ainda tem muito arsenal pra matar.
Crítica por pai dela de adidas @mafravillainy, Rafael Mafra.
CRÍTICA: Sidoka - Dokaz
Reviewed by Rafael Mafra
on
06 setembro
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